Abra com
cuidado
Décio Cintra
Dar presente é fogo.
Acertar o que a outra pessoa vai gostar nem sempre é fácil.
Principalmente no Dia dos Namorados, porque às vezes a gente ainda não
tem aquela intimidade toda para acertar a mão. Mas – o que pouca gente
repara – receber presente de namorada pode ser também muito perigoso. Um
embrulho bem caprichado, por menor que seja, pode conter mensagens
terríveis.
Estou falando do tipo de garota que acredita ser capaz de mudar um
homem. Talvez todas acreditem ter esse poder, mas depois de alguns anos
de casamento, a natureza vai acalmando esse ímpeto e elas vão aceitando
o traste que cruzou seu caminho. Mas, na fase do namoro, a fúria
reformadora está lá, pronta para entrar em ação.
Quer saber o que é um presente perigoso? Camisa fashion. Como reconhecer
uma? Fácil. Vista a dita cuja e vá ao escritório. Se mais de duas
pessoas falarem: "Nossa, como o cara está fashion hoje!", dispare o
alarme. Ela quer modernizar o seu guarda-roupa. Aquela história de ela
fantasiar que você é um borracheiro sujo de graxa e dizer para as amigas
que aprecia seu "charme rude" já acabou. Prepare-se para muitos palpites
sobre combinações de cores. E o golpe de misericórdia será no sábado em
que ela convidá-lo para passear na Oscar Freire ou no Fashion Mall.
Receber uma roupa de presente pode carregar uma mensagem subliminar.
Ganhar um maiô pode significar que ela não suporta mais adiar aqueles
dias na praia que você vive prometendo para ela.
Às vezes a garota pode ter boas intenções. Dar o último livro do Nick
Hornby para o namorado cujo nível de leitura não ultrapassa os gibis do
Batman é louvável. Ineficaz, mas louvável. O cara não vai ler mais por
causa dela, nem trocar o pagode do Katinguelê por um concerto de música
clássica, nem assistir ao Discovery Channel na hora do futebol.
Mas há presentes mais incisivos. Um amigo que cultiva com carinho uma
barba de oito anos ganhou um barbeador no Dia dos Namorados do ano
passado. Difícil imaginar um recado tão direto como esse. A namorada
(hoje, ex-namorada) poderia ter aberto o jogo com ele. Talvez recebesse
um pé na bunda mais civilizado. Ou, no mínimo, teria economizado o
dinheiro gasto no barbeador.
* Décio Cintra acha que na hora do presente o
que vale é a intenção, mas acertar sempre é bom.
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