Nova espécie
de réptil que viveu há 237 milhões de
anos é descoberta
Um fóssil
doado anonimamente para o Museu
Municipal Aristides Carlos Rodrigues, da
cidade de Candelária, na região
centro-oeste do Rio Grande do Sul, está
ajudando a aumentar o conhecimento que
se tinha sobre o Período Triássico (de
251 a 201 milhões de anos atrás) no
território onde hoje fica o Brasil.
Nova espécie
de réptil foi batizada por pesquisadores
de Pagosvenator candelariensis
Pesquisadores
das universidades federais do Rio Grande
do Sul (UFRGS) e do Vale do São
Francisco (Univasf) descobriram que os
restos fossilizados pertenciam a uma
espécie de réptil até então
desconhecida, que viveu há 237 milhões
de anos. Ela foi descrita num artigo
publicado no periódico britânico
Zoological Journal of the Linnean
Society.
O Triássico é
o primeiro período da Era Mesozoica -
que teve ainda o Jurássico (entre 195 a
136 milhões de anos) e o Cretáceo (entre
136 a 65 milhões de anos) - um
importante momento na história da vida
dos animais terrestres, porque é o
intervalo de tempo no qual surgiram os
primeiros dinossauros, além dos
ancestrais dos lagartos, crocodilos e
mamíferos atuais.
Compostos por
um crânio, uma mandíbula, algumas
vértebras do pescoço e placas ósseas do
dorso do animal, os restos foram
analisados com técnicas de tomografia
computadorizada, a partir das quais os
cientistas obtiveram muitas informações
sobre a anatomia dos ossos do animal sem
danificá-los.
Quando
descreveram a nova espécie, os
pesquisadores não sabiam onde exatamente
o fóssil havia sido encontrado, por isso
a batizaram de Pagosvenator
candelariensis, em homenagem ao
município ao qual pertence o museu e que
é rico em sítios paleontológicos de
grande valor científico.
Caçador dos
pagos
O nome
significa "caçador da região de
Candelária". Pago ou pagos é um jargão
do linguajar gaúcho usado para se
referir à cidade natal ou região de
origem de alguém. O termo é derivado do
latim pagus, que significa aldeia,
região, província. Venator, também do
latim, quer dizer caçador.
Fóssil
do Pagosvenator candelariensis |
Segundo o
líder da pesquisa, Marcel Lacerda, que
conduziu o trabalho durante seu
doutorado no Programa de Pós-Graduação
em Geociências da UFRGS, o Pasgosvenator
era um animal de médio porte, com até
três metros de comprimento, e, com base
na comparação com outras espécies
semelhantes já conhecidas, existe forte
evidência de que seria um quadrúpede.
"Por causa dos
dentes longos, recurvados e com
serrilhas que o animal possuía, podemos
inferir também que provavelmente ele era
carnívoro", revela.
"O réptil
devia se alimentar de pequenos e médios
animais."
O professor de
paleontologia da Univasf, Marco França,
coautor do estudo, foi responsável pela
análise mais acurada da linhagem
evolutiva e dos parentescos da nova
espécie. De acordo com ele, o
Pagosvenator pertence ao grande grupo
dos arcossauros, que, por sua vez, se
divide em dois subgrupos: um formado por
dinossauros, pterossauros e aves, e
outro pelos ancestrais dos crocodilianos
modernos.
"Ele não tem
relação com as aves nem com os
dinossauros, mas está na linhagem que
deu origem aos crocodilos, embora ainda
seja muito distante deles", explica.
Mais
especificamente, o grupo a que pertence
o Pagosvenator é o denominado de
Erpetosuchidae.
"Apesar de ser
conhecido e estudado há muito tempo
(desde o século XIX), não se possui
muitas informações sobre a anatomia e as
relações de parentesco entre os
componentes desse grupo", diz França.
"Isso porque
ele é representado apenas por espécimes
incompletos. Até nossa descoberta, havia
apenas duas espécies descritas no mundo,
a Erpetosuchus, do Triássico Superior
(230 a 227 milhões de anos), da Escócia,
e a Parringtonia, do Triássico Inferior
(240-242 milhões de anos), da Tanzânia."
Já o
Pagosvenator é do período entre o
Triássico Médio e Superior, vindo de
rochas datadas entre cerca de 240 a 235
milhões de anos atrás. Desse modo, o
fóssil novo conectaria temporalmente os
dois registros anteriores do grupo.
Outra descoberta é que o novo réptil
muda o local de origem dos
Erpetosuchidae.
"Ele é o mais
basal desse grupo", explica França.
"Isso é significativo, porque indica que
o animal que descobrimos estava mais
próximo do ancestral comum de todos dos
Erpetosuchidae. Sendo assim, a origem
deles não estava na África ou na Europa,
mas sim na América do Sul. Claro que
temos que considerar que, nessa época,
os continentes estavam unidos em um
supercontinente chamado de Pangea."
Características regionais
O trabalho é
importante, ainda, porque se soma a
outros estudos na área que buscam
compreender como era a região onde o
Pagosvenator viveu há 230 milhões de
anos.
"Graças a
essas pesquisas, hoje sabemos que os
predadores dessa época eram bem
diversos", diz França.
"Vários deles,
como o próprio Pagosvenator
candelariensis, eram maiores que os
dinossauros do mesmo período."
Dessa forma, a
descoberta amplia o conhecimento das
espécies fósseis do Rio Grande do Sul e
do Brasil, e aumenta a compreensão dos
processos evolutivos que levaram à
diversidade de registros fósseis do
país.
"Toda
informação nova é útil para conseguirmos
entender como eram o ambiente e a fauna
daquela época", diz Lacerda. "São dados
que ajudam a contar a historia da
diversidade da vida daquele período."
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