Assim como os mustangues
norte-americanos, os animais que deram origem à raça crioula eram caçados e
domados tanto pelos índios cavaleiros, os charruas, quanto pelos estancieiros.
Atualmente, a raça crioula está espalhada por todo o Brasil, mas especialmente
na região froteiriça do Rio Grande do Sul, onde está o principal símbolo da raça,
os descendentes de La Invernada Hornero, de Uruguaiana.
O Cavalo Crioulo no Brasil
O berço do cavalo Crioulo é o sul do Brasil, fronteira com o Uruguai e, são
criados na região do Rio Grande do Sul.
É uma variedade da raça crioula da América latina. Como os outros cavalos deste
continente, ele é produto da mistura de raças de origem africana (cavalo árabe
primitivo) e européia.
Para o cavalo crioulo do Brasil, as duas origens étnicas são equilibradas.
Herdou do cavalo árabe sua altura que raras vezes ultrapassa 1,50 m, sua cabeça
é de corte triangular, seu perfil ligeiramente convexo e reto, suas orelhas
curtas e bem separadas, sua garupa pouco inclinada e seu caráter ativo. Do seu
antepassado europeu, herdou sua crina abundante, seu aspecto pequeno, porém
forte e sua tranqüilidade.
Sua descendência árabe é bem marcante.
Historia
Em 1493, os cavalos espanhóis
pisam pela primeira vez em terra americana, na ilha Hispaniola, e são os
antepassados diretos, de todos os cavalos “crioulos” americanos. Uma vez
aclimatados ao novo ambiente e incrementada sua criação com as importações
realizadas posteriormente, reproduziu-se com rapidez, em poucos anos, estendeu-se
para as outras Antilhas e passou ao Continente. Ao que tudo indica, Panamá e
Colômbia foram as primeiras regiões em importância na produção de rebanhos. Do
Panamá passaram ao Peru, levados por Pizarro, onde começaram a multiplicar-se a
partir de 1532. É também ali que chegam, em 1538, cavalos provenientes da
criação de Santiago de Uruba (Colômbia). Charcas transforma-se, assim, em um
importante centro produtor de eqüinos.
Contemporaneamente, Pedro
de Mendoza (1535) e Alvar Núñez Cabeza de Vaca (1541) introduzem cavalos,
diretamente da Espanha, no Rio da Prata e no Paraguai. Alonso Luis de Lugo se
compromete a levar duzentos cavalos da Espanha para a conquista de Nova Granada
e Hernando de Soto sai de San Lúcar de Barrameda (1538) com cem cavalos para sua
expedição na Flórida. A partir deste momento, começa um verdadeiro intercâmbio
de rebanhos eqüinos entre distintas regiões. Procedem de Charcas as manadas que
Valdivia levou ao Chile, em 1541, as que Diego de Rojas levou para Tucumam, em
1548, e as que Luis de Cabrera levou para Córdoba, em 1573, e logo a seguir para
Santa Fé. Nesta zona, mais ou menos na mesma época, chegam cavalos paraguaios,
trazidos por Garay, descendentes daqueles que, 30 anos antes, Cabeza de Vaca
introduziu diretamente da Espanha e dos que, em 1569, Felipe de Cáceres levou do
Peru. Do Paraguai, procederam também os rebanhos eqüinos que chegaram à Buenos
Aires, em 1580, levados por Juan de Garay e Adelantado Juan Torres de Vera e
Aragón para Corrientes, em 1588. Do Chile, chegam à Argentina em 1561, através
de Cuyo, rebanhos trazidos por Francisco de Aguirre, Castillo e outros.
Em 1605, entram no Chile os animais que o governador chileno Garcia Ramos levou
do Rio da Prata e, em 1601, os que o Capitão López Vasques Pestaña levou de
Tucumam. Verifica-se (Goulart, 1964) que a criação de cavalos se inicia nas
reduções do Rio Grande do Sul em 1634, com os animais trazidos pelos padres
jesuítas Cristóbal de Mendonza e Pedro Romero, de Corrientes, para onde os
cavalos haviam sido levados, a partir de Assunção, por Alonso de Vera e Aragón,
em 1588.
Paralelo a este movimento de rebanhos mansos, seja por abandono ou fuga dos
domesticados, ou porque, com o correr dos anos, o número destes foi aumentando
de tal forma que superou as possibilidades ou as necessidades dos primeiros
habitantes de mantê- los sob controle no Norte e no Sul do continente americano,
este primitivo rebanho crioulo se dispersou, formando enormes rebanhos selvagens
que, no México e Estados Unidos, foram chamados de “mesteños” e “mustangs” e de
“cimarrones”, nas ilhas e América Central. No Rio da Prata os designaram como “baguales”,
o “kaitá” dos índios pampas que acompanharam o Dr. Zeballos (1834) em sua viagem
ao Chile, ou “saguá”, dos índios do Noroeste argentino. Dos dispersados, os “cimarrones”,
que habitaram os “lençóis dominicanos” ou “planos da Venezuela”, diz-se que eram
caçados no primeiro quarto do século XVIII. Roberto Cunninghame Graham (1946)
diz em seu livro que, por esses anos, nos planos da Venezuela, era o único lugar
da América onde podiam encontrar-se cavalos “cimarrones”.
O “mustang” americano ou o “mesteño” mexicano tem origem parecida. Cabrera (1937
e 1945) e Denhardt (1947) explicam que não podiam ser cavalos abandonados ou
perdidos pelas expedições de Cabeza de Vaca (1528, 1537), de Soto (1539, 1543)
ou pela de Coronado (1540, 1542), porque a primeira não levava cavalos e as duas
últimas praticamente perderam todas suas montarias, mortas por fadiga da viagem
ou pelos índios. Acredita-se que foi Juan de Oñate, por volta de 1595, quem
levou ao Sudoeste dos Estados Unidos os antepassados do “mustang”.
Parte daqueles cavalos domesticados se dispersaram posteriormente das missões,
fazendas ou “ranchos” atacados pelos índios e constituíram o que a literatura
americana chamou de “cavalos selvagens”, que eram cavalos mansos que viraram
selvagens, “cimarrones” ou “baguales”, segundo as denominações que lhes deram
nos “lençóis dominicanos” ou na “pampa sul-americana”. Dos originais “ginetes”
andaluzes, possivelmente muitos morreram durante as conquistas, mas outros, sem
dúvida, se reproduziram e seus descendentes, aclimatados pelo meio americano
durante muitas gerações, forjaram essas populações crioulas, constituídas pelo
“pequeno grande cavalo da América”, como acertadamente batizou Guilherme
Echenique.
Sem dúvida, o Crioulo é descendente direto do cavalo trazido para a América
pelos conquistadores. O mais difícil de demonstrar é a composição étnica da
população eqüina da Espanha nessa época, quais eram os tipos de cavalos que
predominavam e quais, por razões de distribuição geográfi ca, poderiam ser os
que vieram à América e deram origem à nossa raça Crioula. Prado (1941), fez um
estudo das “ascendências” etnográficas do cavalo chileno de 1541. Segundo o
autor, os tipos primitivos de cavalos que tiveram marcada infl uência na
conformação do Crioulo são os cavalos celta e saloutre, cuja combinação originou
a antiga “Jaca espanhola” (cavalo de alçada inferior a 1,47 metros - U. Prado,
“El Caballo Chileno”, pág. 13), o bérbere ou raça africana, o asiático ou árabe
e o germânico ou nórdico. Estes tipos de cavalos podem dar uma idéia aproximada,
segundo Prado, do que foi o cavalo espanhol daquela época. O professor Ruy
D’Andrade, em seus trabalhos (1935, 1939 e 1941), especialmente nestes três, em
que estuda os elementos básicos da população eqüina da Península Ibérica,
representa um valioso aporte para o estudo dos antepassados de nossos Crioulos,
confi rmando a origem européia dos mesmos, ainda que marcadamente influenciados
pelo tipo bérbere ou africano, mas alheios, quase por completo, da influência do
asiático ou árabe. Da união desses tipos “garrano” e “líbico” (cavalo andaluz de
perfil convexo ou subconvexo), o autor supõe que se deriva o tipo andaluz de
perfil reto, e que os primeiros resultam, mais que sufi ciente para justificar
no nosso Crioulo, nos tipos de perfil, chamados “asiáticos” e “africanos”,
respectivamente, e que o autor chama de “tipo garrano ou celta” e de “tipo
andaluz ou líbico”. Admite, igual a Dr. Cabrera, uma infl uência preponderante
de bérbere na formação do cavalo espanhol, mas sem atribuirlhe, na realidade, o
caráter de verdadeiro cruzamento, já que por uma hipótese, o autor lusitano
supõe que “o cavalo andaluz não é nenhum parente próximo do árabe, nem
descendente do bérbere, nem germânico, e sim, uma raça natural e local,
transformada pela domesticação e por diversos cruzamentos sucessivos, efetuados
até os tempos atuais. A estes grupos pertencem os cavalos bérberes e germânicos”.
A infusão de sangue bérbere no tipo antigo andaluz viria a ser, assim, só um
refresco de sangue e não um cruzamento. Eliminando o árabe como fator importante
na formação das raízes da raça, só duas origens étnicas importantes tendem a
equilibrar sua ação nela: o “africano”, representado pelo cavalo bérbere
primitivo, e o “europeu”, produto da fusão dos tipos celtas, do soloutre e
germânicos. Destacam-se, entre as características comuns herdadas de seus
antepassados, a alçada mediana, que difi cilmente chega ou supera 1,50 metros,
sua cabeça curta, triangular, de perfil reto ou subconvexo, as orelhas curtas
bem separadas, amplas em sua base e pouco perfi ladas, o pescoço erguido, a
garupa pouco inclinada e o temperamento ativo, herança do bérbere, que se unem à
abundância de crinas e cola, ao aspecto “baixo e forte” e ao caráter tranqüilo
de seus antepassados europeus. |