Concentração de CO2 na
atmosfera da terra ultrapassa os limites do
suportável
Fato pode superar limiar da catástrofe em 25
anos, sugere estudo de grupo internacional
Um grupo internacional de cientistas acaba de
publicar um estudo no qual prevê que a
concentração de dióxido de carbono no ar em 2016
terá a maior elevação de todos os tempos e
terminará o ano no patamar de 404 ppm. Ou seja,
em cada milhão de moléculas de ar no planeta,
haverá 404 do principal gás de efeito estufa.
Dito assim parece pouca coisa. Mas, nos últimos
800 mil anos, essa concentração jamais
ultrapassou 300 ppm. E, quando chegou nesta
faixa, o mar subiu cerca de dez metros no mundo
todo, devido ao derretimento do gelo da
Groenlândia e de parte da Antártida.
É que o gás carbônico segue a máxima segundo a
qual os piores venenos estão nos menores frascos:
ele é tão eficiente em aprisionar o calor
irradiado pela Terra na atmosfera que mesmo uma
quantidade ínfima tem grande potencial de
aquecer o planeta.
Então, 404 ppm definitivamente não parece um
limiar recomendável para cruzar. Só que é tarde
demais agora: o climatologista Richard Betts, do
Met Office britânico, e seus colegas afirmam que
não retornaremos tão cedo a patamares de
concentração de CO2 menores do que 400 ppm.
Mesmo que a taxa anual de acúmulo desse gás no
ar caia nos próximos anos em relação a 2016 o
que é muito provável que aconteça , a humanidade
poderá ultrapassar o limite de 450 ppm em cerca
de 25 anos. Este é o limite que separa o mundo
de um aquecimento potencialmente catastrófico
neste século.
A nova análise foi publicada em 13 de junho na
edição on-line da revista Nature Climate Change.
Ela tem entre seus autores o americano Ralph
Keeling, da Universidade de San Diego, que
dedica sua vida a medir CO2 no alto do vulcão
Mauna Loa, no Havaí. Trata-se de um antigo
negócio de família, que rendeu ao mundo uma das
constatações mais chocantes sobre o aquecimento
global.
Keeling ainda não era nascido em 1958, quando
seu pai, Charles, instalou no alto do mesmo
vulcão o primeiro equipamento para medir as
concentrações de CO2 na atmosfera. A pesquisa de
Charles Keeling tinha como objetivo comprovar ou
não a tese de um professor dele, Roger Revelle,
de que o CO2 produzido por atividades humanas
estava se acumulando perigosamente no ar e
aquecendo o planeta. A resposta, dada já ao
final do primeiro ano de medições, era positiva.
Keeling pai iniciou uma série de medidas mensais
do CO2 que resultou em um dos gráficos mais
famosos da história da ciência, a chamada curva
de Keeling (que ilustra esta página). As
medições foram continuadas por Ralph após a
morte de Charles, em 2005.
A curva é cheia de dentes, que correspondem à
variação sazonal da quantidade de carbono no ar:
esta sobe no outono e no inverno, quando as
florestas do hemisfério Norte perdem suas folhas
(liberando carbono por decomposição), e cai na
primavera e no verão, quando ocorre a rebrota (e
o sequestro de CO2 do ar). Ano após ano, porém,
o que a curva mostra é um crescimento contínuo
das concentrações do gás. No primeiro ano de
medição, havia 315 ppm de CO2 na atmosfera. Em
2013, o limiar de 400 ppm foi cruzado pela
primeira vez no outono, no pico sazonal. Mas a
média anual ainda estava abaixo disso. Em 2015,
o valor anual fechou em 400,9 ppm.
Na última década, a concentração de gás
carbônico no ar tem crescido a uma taxa média de
2,1 ppm por ano. Só que em 2016 ela deve ser
ainda maior: 3,15 ppm. Trata-se de uma previsão
feita por Betts, Ralph Keeling e colegas com
base no comportamento de dois fatores conhecidos:
o ciclo de carbono, que inclui as emissões de
CO2 por desmatamento e combustíveis fósseis, e
as temperaturas do oceano, que determinam quanto
CO2 dissolvido no mar acabará na atmosfera (quanto
mais quente, menos CO2 o mar absorve).
A aceleração prevista se deve, neste ano, ao
malvado favorito do momento entre os
climatologistas: o El Niño. O fenômeno cíclico
do aquecimento do Oceano Pacífico aumenta a
emissão de carbono por ecossistemas tropicais e
o risco de incêndios florestais, como ocorreram
em 1998 na Amazônia e na Indonésia e neste ano
novamente na Indonésia.
O modelo usado pelos pesquisadores para fazer
sua previsão da concentração anual foi testado
para alguns meses deste ano. A previsão era a de
que o CO2 chegasse a 407,57 ppm em maio e 406,7
em abril. A medição no Mauna Loa, porém,
registrou 407,57 ppm já em abril, o que sugere
que o modelo pode ser ligeiramente otimista. A
força do El Niño deste ano é tamanha, notam os
pesquisadores, que a alta é esperada mesmo com a
ligeira queda na taxa de emissões por uso de
energia no mundo entre 2014 e 2015.
Mas e depois que o El Niño passar e o planeta
entrar na fase fria conhecida como La Niña,
ainda este ano?
As concentrações mínimas anuais de CO2 poderiam
cair novamente abaixo de 400 ppm? Isso é
excepcionalmente improvável, escreveram os
autores. Aqui quem entra em ação para controlar
a marionete do CO2 são as emissões humanas. E,
mesmo no cenário mais benigno de emissões
descrito pelo IPCC, o painel do clima da ONU um
cenário que envolve sequestro maciço de carbono
em usinas de bioenergia e que Keeling, Betts e
colegas dizem que é também pouco crível de
alcançar , as concentrações ficam acima de 400
ppm até o ano 2150. Portanto, nossa previsão
apoia a sugestão de que o registro do Mauna Loa
não voltará a mostrar concentrações menores que
400 ppm no nosso tempo de vida.
A poluição e o desmatamento precisam ser
revertidos, ou o futuro de todas as espécies
estará comprometido, inclusive a humana. |
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