Qualidade da água que
já era ruim em São Paulo piora por causa da
crise hídrica
A qualidade da água que chega às torneiras
paulistanas piorou durante a crise hídrica em
São Paulo. A quantidade de amostras de água
consideradas “insatisfatórias” em relação ao
padrão legal de qualidade de São Paulo triplicou
desde 2013.
Os dados, elaborados pela equipe do Programa
Municipal de Vigilância da Qualidade da Água
para Consumo Humano, mostram que a média de
amostras “insatisfatórias” recolhidas na rede de
abastecimento público passou de 3,49% há dois
anos, antes de desencadear a crise hídrica, a
12,32% em maio de 2015.
A Prefeitura de São Paulo informa que, apesar
dos resultados fora do padrão, a água da
torneira continua sendo potável. O aumento do
índice de resultados atípicos é apenas um alerta
da vulnerabilidade atual da água e mostra que
cresceu a exposição aos riscos de contaminação.
As consequências têm sido relatadas pelos
usuários nos últimos meses com casos de água
turva ou com sabor ou cheiro desagradáveis,
casos de doenças pelo consumo de água
contaminada já foram relatadas por este jornal.
No ano de 2015, os resultados insatisfatórios
mais comuns nos laudos de vigilância referem-se
aos parâmetros de turbidez, cloro residual livre,
bactérias heterotróficas e coliformes totais (ver
abaixo).
O principal motivo para o aumento de amostras
fora do padrão, segundo o programa municipal,
foi o remanejamento de água de diferentes
regiões para compensar a queda nos reservatórios.
A operação misturou água de vários sistemas de
abastecimento. “A falta d’água e a
despressurizarão também podem comprometer a
qualidade, tornando a rede mais vulnerável à
contaminação externa”, explica Cleuber José de
Carvalho, responsável pelos trabalhos de coleta
e análise que têm como objetivo detectar
situações de risco à saúde.
Para reduzir as perdas e o consumo de água por
causa da crise, a Sabesp tem diminuído a pressão
da água em vários pontos da rede, o que seca
torneiras pela cidade diariamente. As manobras
de redução da pressão adotadas pela companhia
incluem também o fechamento manual e total dos
registros em várias regiões, e aumentam o risco
de contaminação. Isso acontece porque, com as
tubulações com menos água ou vazias, a água não
tratada do solo consegue se infiltrar nos canos.
“Esses
dados só confirmam o que venho dizendo há muito
tempo, a crise não é só de quantidade, mas de
qualidade”, conclui o pesquisador José Galizia
Tundisi, que atou em crises hídricas em mais de
40 países e avaliou os resultados da Prefeitura
a pedido deste jornal. O pesquisador considera
“alto” o índice e convida os órgãos de controle
a atuar mais eficientemente.
“Embora os dados sejam preocupantes, não creio
que deva ocorrer um informe à população. O que
deve ser exigido pela vigilância sanitária –
estadual e municipal – e os órgãos de controle é
a identificação das causas e das falhas do
sistema de tratamento que estão gerando estas
porcentagens de amostras fora dos padrões de
potabilidade”, explica Tundisi.
Para ele, a "deterioração da qualidade da água
na origem, nos mananciais, que se agrava com a
crise hídrica” é a causa principal apontada para
explicar o aumento de amostras "insatisfatórias".
A situação atual dos principais mananciais de
São Paulo é considerada crítica: o Cantareira
opera hoje com 11,6% da capacidade contando duas
cotas de volume morto, enquanto o Alto Tietê,
ainda mais castigado, tem só 13,1% da capacidade,
sem volume morto disponível.
Em julho,
reportagem do EL PAÍS mostrou que os casos de
diarreia aguda tiveram um aumento importante no
Estado de São Paulo em 2014, associado à crise
hídrica. O Centro de Vigilância Epidemiológica,
da Secretária Estadual de Saúde, qualificou 2014
como um ano “hiper-epidêmico”, após uma análise
detalhada, embora preliminar, das notificações
de surtos da doença.
O órgão associa o aumento de casos comunicados –
quase 35.000 em algumas semanas de fevereiro,
março e setembro – aos problemas de
abastecimento de água. Além da diminuição de
pressão e da intermitência do abastecimento, o
uso da água de poços e caminhões-pipa, cuja
qualidade não é sempre fiscalizada conforme a
lei, são apontadas como causa no estudo.
Sabesp nega
problemas
O presidente da Sabesp, Jerson Kelman,
comprometeu-se a investigar o elo entre doenças
e qualidade da água e enviou técnicos aos
endereços onde foram relatados casos de diarreia
e Hepatite A e que foram divulgados por este
jornal. O relatório das cinco vistorias
contemplou os depoimentos dos consumidores sobre
o mal-estar sofrido mas concluiu na maioria dos
casos que a contaminação foi pontual. Baseado em
"análises" não divulgados, o relatório afirma
que a água coletada nos locais não apresentou
anomalias.
(com conteúdo de El País)
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